Jardim Japonês (parte 1)

2024 Autor: Sebastian Paterson | [email protected]. Última modificação: 2023-12-16 13:53

Jardim japonês: parte 1, parte 2, parte 3, parte 4.

• Jardim haicai japonês
• Jardim japonês em miniatura
• Sakutei-ki

Jardim haicai japonês

“Um jardim japonês pode ser comparado a um poema de haicai. Ele reduz a complexidade do mundo natural à sua essência no jardim " ¹disse o paisagista da Califórnia Mark Bourne, que usa plantas nativas no jardim para capturar o wabi - a reclusão poética que caracterizou a cultura do jardim de chá do século 16 (tianiwa). Casas de chá - “chashitsu” naquela época estavam localizadas fora das cidades e assumiam uma fuga da agitação da vida urbana e da solidão no campo. Essa tradição é preservada e mantida no Japão até hoje. Os convidados para a cerimônia do chá iniciam sua jornada para a casa de chá por um caminho de pedra ("roji"), que gradualmente leva o convidado à casa de chá, onde o proprietário irá preparar e servir o chá de acordo com as regras estritas da cerimônia do chá ritual.

O jardim de chá japonês ideal é visível através da janela como parte e extensão da casa de chá ou pavilhão. As pessoas que estão nele, tomando chá, relaxam à mesa do quarto interno ou em uma poltrona na varanda coberta. Você pode ter prazer estético olhando pela janela de um jardim japonês em qualquer clima e em qualquer época do ano, pois os jardins japoneses são projetados de forma que sua composição leve em conta as mudanças das estações.

Os jardins de chá variam em tamanho e no que está dentro do jardim. Dependendo do desejo e das possibilidades, o jardim pode conter árvores, flores, plantas verdes, cachoeiras artificiais, riachos, pedras localizadas separadamente ou enormes rochedos. No entanto, um jardim de chá pode ser criado com custos muito modestos e em uma área muito pequena, e esses jardins modestos requerem manutenção mínima. Se desejar, você pode criar um lindo jardim japonês nas condições apertadas de um ambiente urbano, em uma pequena varanda de um apartamento na cidade, no parapeito de uma janela e até mesmo em uma escrivaninha. Se você escolher um ponto de vantagem com sucesso, poderá alcançar o efeito de estar em um jardim japonês e recarregar sua energia vital após a agitação e o estresse de que nossa vida está cheia.

Jardim japonês em miniatura

Enquanto folheava revistas antigas, na edição de outubro de 1930 da revista americana Popular Mechanics, encontrei um artigo de Bob Hartley sobre como criar eu mesmo um jardim japonês em miniatura. Gostei da ideia. Acho que todos aqueles que também sonham com seu jardim japonês único, mas não sabem nada sobre ele ou não têm um terreno adequado para criar um jardim em tamanho natural, serão atraídos pela ideia de criar um jardim japonês em miniatura, mas real, com plantas vivas e um lago de verdade, que precisará ser cuidado da mesma maneira que um jardim japonês em tamanho natural.

Uma solução alternativa seria criar um jardim japonês usando objetos artificiais: bonsai artificiais, arbustos artificiais em miniatura, flores, pedras e areia. Se alguém for atraído pela ideia de um jardim em miniatura, você pode usar estatuetas e componentes de vários modelos de jardim de pedras japonês disponíveis comercialmente.

O principal é que o jardim que você vai criar não deve deixar a impressão de figuras caoticamente coletadas, pedras e plantas que não se harmonizam em tamanho e proporções, que os japoneses irão apreciar como uma farsa vulgar, e esse jardim dificilmente irá ajude-nos a entrar em sintonia com a atmosfera de relaxamento e percepção de beleza ainda que em miniatura, mas um verdadeiro jardim japonês.

Portanto, antes de começar a criar esse jardim japonês em miniatura, você precisa imaginar o que está investido no conceito de "jardim japonês", em que elementos ele consiste e quais são os princípios de sua composição

Sakutei-ki

Nas profundezas de um coração solitário, sinto que devo morrer

Como uma gota de orvalho pálido

Na grama de meu jardim

Nas sombras cada vez mais espessas do crepúsculo ²

Senhora Casa (século VIII)

O imperador chinês Ying Zheng Qin Shi Huang (259-210 aC) entrou para a história como o governante do primeiro estado chinês centralizado, sob o qual a Grande Muralha da China e um enorme complexo funerário com o famoso "exército de terracota" acompanhariam o imperador na vida após a morte. Seu nome está associado ao surgimento da pintura de paisagem chinesa e à criação de complexos palacianos cercados por parques paisagísticos, representando em tamanho reduzido todos os recantos dos vastos domínios do primeiro imperador chinês.

Durante o reinado de Qin Shi Huang, uma arte peculiar de "penjing" nasceu - a criação de modelos em miniatura de paisagens. Nos séculos seguintes, a arte de criar composições naturais em miniatura a partir de pedras, areia e plantas foi desenvolvida. Durante este período, iniciou-se a formação de várias direções e escolas desta forma de arte, que teve continuidade no Japão, onde, com base no conhecimento trazido da China sobre a criação de um ambiente harmonioso e modelos em miniatura de "penzhin", surgiram novos rumos, diferindo na técnica e métodos de exibição de paisagens naturais, como bonsaki, suiseki, saikei, bonkei e bonsai.

Os primeiros jardins surgiram no Japão durante a construção de grandes túmulos lá, chamados Kofun (300-552) ³ … Na área de Asuka, na prefeitura de Nara, durante as escavações arqueológicas, foram descobertos riachos e lagos artificiais formados por seixos e paralelepípedos, que foram construídos por artesãos chineses e se assemelhavam em estrutura a grandes jardins chineses com lagos. No período subsequente de Nara (710-784), existem mais e mais jardins desse tipo e, muito provavelmente, os mestres locais começaram a criá-los. Os jardins deste período distinguiam-se pelas linhas mais suaves das margens dos ribeiros e lagoas, as margens das lagoas não eram reforçadas com paredes de pedra, mas possuíam cardumes sinuosos e praias de seixos. Nos últimos anos, dois jardins daquela época foram restaurados na cidade de Toin, Prefeitura de Mie e no complexo do palácio na antiga capital do Japão, Heidze-Ke (século VIII). A época de ouro dos jardins aristocráticos japoneses, quando o desenvolvimento da arquitetura do jardim atingiu sua apoteose,cai no período Heian (794-1185), cujo nome pode ser traduzido como "calma, paz". O mais antigo manual de jardinagem "Notas sobre a organização dos jardins" - "Sakutei-Ki", mais conhecido em russo como "Tratado sobre Jardinagem" ou "O Livro Secreto dos Jardins", pertence a este período. Este tratado não perdeu seu significado na atualidade.

E quase todos os autores que escreveram sobre jardins japoneses depois se referiram a esse tratado. A grafia "Sakutei-Ki" é tradicionalmente atribuída a Tachibana Toshitsuna (1028-1094). Apesar do fato de que este período foi marcado pela construção de um grande número de templos budistas e um aumento no número de praticantes do budismo entre a população japonesa, em Sakutei-Ki a crença Shinto de que todos os objetos são seres sencientes é aplicada à composição do jardim. Esse conceito, característico do período Heian, é denominado "mono no avare", que se traduz literalmente como "pathos de objetos". “Mono no avare” também pode ser traduzido como “consciência da transitoriedade”, “sensação de fugacidade”. Um estado que corresponde a tal sentimento pode ser descrito como uma alegria amarga por tudo ser passageiro, assim como tristeza e saudade por tudo ser passageiro. Esse sentimentoParece-me que a poetisa do início do século 8, Kasa no Iratsume, também conhecida como Sra. Kasa, que escreveu poemas no estilo waka, um gênero japonês de letras de amor populares no Japão medieval, foi transmitida com sensibilidade.

O conhecimento e o uso de waka na correspondência eram um indicador da educação e do gosto da elite iluminada da era Heian. Quem quer que tenha sido o autor de Sakutei-Ki, pode-se dizer sobre ele que, como a Sra. Kasa, muito provavelmente, ele não era um jardineiro, mas um cortesão ou um nobre altamente educado. O tratado fala sobre como criar um bom jardim, sobre os métodos e regras de organização de jardins. Muitos dos conceitos apresentados no tratado são retirados de livros chineses sobre jardinagem e horticultura. No entanto, as diferenças que são características da arte de jardim japonesa já estão surgindo. Assim, por exemplo, repetindo as regras da ciência chinesa de harmonia com o meio ambiente Feng Shui, que é essencialmente a prática taoísta de exploração simbólica do espaço, o autor do tratado oferece soluções alternativas. Segundo o autor, nove salgueiros podem substituir um rio,e três ciprestes são uma colina. O autor acredita que se as regras metafísicas não são razoáveis e limitam o criador do jardim, elas podem ser substituídas por outras mais simples e flexíveis. Essa abordagem é típica do Japão, quando as ideias emprestadas de outros países são alteradas para que se enquadrem nos japoneses e se fundam harmoniosamente na cultura japonesa.

¹ Chadine Flood Gong, Lisa Parramore, Svein Olslund, "Living with Japanese Gardens"

² Traduzido por Z. L. Arushanyan

³ Patrick Taylor, O companheiro de Oxford para o jardim